Por Simone Paiva– Analista de Comunicação da FUNDECC
Projeto “Bases Nutricionais e Fisiológicas para a Otimização do Aproveitamento de Animais de Origem Leiteira para a Produção de Carne em Minas Gerais”, com apoio da FAPEMIG e gestão financeira da FUNDECC, gera dados para valorizar animais e impulsionar a rentabilidade do produtor.
Lavras, MG – Um projeto de pesquisa relevante e de grande alcance, coordenado pelo professor Mateus Pies Gionbelli, está em fase final na Universidade Federal de Lavras (UFLA). O estudo investiga a fundo a viabilidade e a eficiência de integrar as cadeias produtivas do leite e da carne, focando no aproveitamento de bovinos de origem leiteira – incluindo os chamados “machos de descarte” – para a produção de carne de qualidade.
Com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e com a FUNDECC (Fundação de Desenvolvimento Científico e Cultural) realizando a gestão administrativa e financeira do projeto, a iniciativa é uma resposta a um desafio antigo da pecuária: o destino dos bezerros machos nascidos em rebanhos leiteiros, que muitas vezes são subaproveitados.
Unindo as Forças do Leite e da Carne: O Conceito Dairy Beef
A ideia central do projeto, conforme explica o professor Gionbelli, é romper as barreiras entre as duas cadeias. “O conceito de Dairy Beef – que combina ‘leite’ (Dairy) e ‘corte’ (Beef) – significa justamente aproveitar o potencial desses animais que são um coproduto inevitável da produção leiteira. Toda vaca leiteira precisa parir para produzir leite, e naturalmente, cerca de metade desses nascimentos são machos. Nosso trabalho mostra que eles são um recurso valioso, e não um passivo”, destaca.
O pesquisador cita o exemplo de países como a Inglaterra, onde mais de 50% da carne produzida é oriunda de animais de origem leiteira. Um dos pilares dessa integração é a prática do “Beef on Dairy“, que consiste em inseminar vacas de menor mérito genético dentro de um rebanho leiteiro com sêmen de touros de raças de corte especializadas. “Isso gera um bezerro mais apto para a produção de carne, agregando valor imediato à cria e otimizando a rentabilidade da propriedade”, completa Gionbelli.
Quatro Tipos de Animais em Análise e a Realidade Mineira
Para a pesquisa, a equipe selecionou quatro grupos de animais, representando diferentes sistemas de produção. O doutorando Felipe Costa Maciel, integrante fundamental da equipe, detalha a composição do rebanho estudado: “Trabalhamos com 96 animais, divididos entre Holandeses puros adquiridos de parceiros aqui do Sul de Minas, mestiços leiteiros típicos de Minas Gerais, Nelore e Angus, estes últimos vindos de uma fazenda referência no interior de São Paulo“.
Essa comparação é crucial para entender o cenário mineiro. “Minas Gerais possui um rebanho de aproximadamente 22 milhões de cabeças de gado, sendo que cerca de 70% são de perfil corte – um percentual menor do que a maioria dos outros estados, o que reforça a nossa forte vocação leiteira. Entender como os animais provenientes dessa cadeia leiteira podem complementar a produção de carne é estratégico para a economia do estado”, analisa o professor Gionbelli.
Da Dieta Única à Biologia Molecular: A Ciência por Trás da Carne
O mestrando Gabriel Rodrigues Neiva explica que, para refletir as condições reais dos confinamentos comerciais, o estudo foi conduzido com uma dieta única e padronizada para todos os animais. “Nos confinamentos, a logística é fundamental — é muito difícil formular dietas diferentes para cada grupo genético ou categoria sexual. Por isso, adotamos uma dieta única, simulando a realidade de campo”, comenta.
Durante a fase experimental, foram realizados ensaios de digestibilidade e avaliações de eficiência no uso dos nutrientes, diretamente com os animais. Já no laboratório, a equipe analisa amostras de alimentos, fezes, urina, gases e tecidos para calcular com precisão parâmetros como eficiência nutricional, metabolismo e até indicadores de emissão de gases de efeito estufa.
A pesquisa avança ainda para o nível molecular. Foram coletadas amostras de músculo dos animais em diferentes etapas de crescimento e estão sendo aplicadas diversas ferramentas de biologia molecular para compreender os mecanismos que regulam o crescimento muscular. O objetivo é entender, em nível celular, as bases fisiológicas que determinam como o músculo se desenvolve em cada tipo animal, revelando por que alguns animais são naturalmente mais eficientes do que outros. Essas descobertas poderão orientar futuras estratégias de manejo e melhoramento genético, contribuindo para sistemas de produção mais sustentáveis e rentáveis.
Primeiros Resultados e Impacto Esperado

Carne Marmoreio
Felipe, que acompanhou todo o manejo e a etapa de abate, adianta observações promissoras. “Os animais de origem leiteira, especialmente o holandês, mostraram um marmoreio muito bom, que é a gordura entremeada na carne, sinônimo de maciez e sabor. Outra vantagem é que eles tenderam a ter menos gordura subcutânea, o que significa um bom rendimento de cortes comerciais“.
O objetivo final é gerar dados concretos que sirvam de base para toda a cadeia produtiva. “Nossa pesquisa vai quantificar a eficiência de cada sistema. Isso pode embasar desde a negociação entre produtor e indústria até a criação de políticas públicas que incentivem o correto aproveitamento desses animais, tornando a atividade mais sustentável e lucrativa para o produtor”, explica o professor Gionbelli.
FUNDECC: Apoiando a Ciência que Conecta a Universidade à Sociedade
Para Paloma Lisandra, coordenadora de projetos da FUNDECC, iniciativas como essa são vitais. “É um prazer enorme poder fazer parte dessas pesquisas de grande impacto. A FUNDECC atua no apoio administrativo e na gestão financeira do projeto, garantindo que os recursos sejam aplicados com eficiência para o avanço da ciência. Nosso trabalho ganha outro significado quando entendemos a aplicação prática e o avanço científico que estamos fomentando“, diz.
“A divulgação é um dos nossos pilares. Levar esse conhecimento para a sociedade, mostrando que a UFLA e a FUNDECC estão na vanguarda de pesquisas que resolvem problemas reais do setor produtivo, fortalece nossa missão institucional“, finaliza Paloma.
Com a conclusão das análises laboratoriais, prevista para os próximos meses, os resultados finais do projeto prometem oferecer contribuições valiosas para a pecuária nacional, abrindo novos caminhos para a integração das cadeias do leite e da carne.











